As Bandeiras e as Monções

A única vantagem da União Ibérica – para o Brasil, não para Portugal – é a permissividade, característica desse período, em relação às incursões ao interior do continente. Os portugueses se apegaram às áreas litorâneas produtoras de açúcar e até proibiram, em 1549, com Tomé de Souza, as incursões ao interior. Segundo Frei Vicente de Salvador, os portugueses arranhavam a costa do Brasil como caranguejos.

Diferentemente da colonização portuguesa, a espanhola tinha, aliás, como característica a exploração das terras do interior, entre outros aspectos. Um deles a fundação de cidades urbanisticamente organizadas; outro, a criação de universidades. Em 1538, por exemplo, poucos anos após o descobrimento da América, funda-se a Universidade de São Domingos, a de São Marcos, em Lima, e a da Cidade do México, em 1551. No Brasil, as primeiras universidades só surgiriam no século XX.

Segundo Sérgio Buarque de Holande, a interiorização da colonização no Brasil só foi possível com a consistência do couro, não a do ferro, ou seja, dobrando-se, ajuntando-se a todas as asperezas do meio. Com esse processo de interiorização, o país começou a ganhar traços característicos. De forma espontânea, começou a desenhar-se nesse período o território brasileiro tal qual o conhecemos hoje, com sua dimensão continental – bem como a imagem do povo brasileiro, oriunda da miscigenação de africanos, indígenas e europeus, que, segundo Darcy Ribeiro, se desindianizavam, desafricanizavam e deseuropeizavam, e formavam um povo novo, tanto do ponto de vista biológico como cultural. 

Outro aspecto importante de tais incursões é que essas andanças serão responsáveis por criar uma imensa rede de comunicação pelo país. As bandeiras eram expedições que seguiam abrindo caminhos e estradas por terra, e as mais importantes foram as comandadas por Fernão Dias, Bartolomeu Bueno da Silva, Domingos Jorge Velho e Raposo Tavares. Outro tipo de expedição era a fluvial, que seguia, portanto, desbravando o território ao longo dos rios. Era conhecida como monções porque ocorria apenas nos períodos mais propícios à navegação, respeitando a natureza dos rios, cheio e vazante. Essas expedições fluviais descobrira, por exemplo, o que hoje é a hidrovia Tietê-Paraná, que interliga as regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste do Brasil. Ambos os tipos de expedições serão importantíssimos para a unificação, expansão e consolidação do território. Nesse sentido, ao chegar ao final a União Ibérica, o Brasil já será outro. Mas o aspecto mais importante nesse período da União Ibérica e desse processo de avanço em direção ao interior do continente (único positivo para Portugal) será a descorta do ouro. Esse ouro se tornará a salvação da pátria portuguesa depois que a União Ibérica acabou com o negócio do açúcar.