O Estado Novo

O Estado Novo

Há um velho ditado que diz: Não há nada que esteja tão ruim que não possa piorar. A nova (e quarta) Constituição brasileira — no Brasil muda-se a Constituição de acordo com a ocasião — centralizava os poderes nas mãos do presidente, que podia, entre outras arbitrariedades, dissolver o Congresso, criar decretos-leis, extinguir partidos políticos (todos foram colocados na clandestinidade), abolir a liberdade de imprensa (por meio da criação do DIP — Departamento de Imprensa e Propaganda), voltar à figura do interventor para governar os estados e alongar o mandato presidencial, que era de quatro anos na Constituição de 1934, mas que em 1937 passou a ser… infinito.

O Estado Novo representou o estreitamento da aliança entre a burguesia industrial e o governo após a grande instabilidade que, do ponto de vista dessa elite, significou, primeiro, a ação da ANL na tentativa de organização dos trabalhadores e do golpe de Estado, e, segundo, a possibilidade de retorno ao poder da oligarquia do café nas eleições que se realizariam em 1938. O objetivo do consórcio entre a elite industrial e o governo Vargas era um só: promover a industrialização do país, projeto que já havia sido esboçado na Revolução de 1930 e que se consolidara com a derrota da oligarquia do café em 1932, na Revolução Constitucionalista. No entanto, essa industrialização dependia inteiramente de uma intervenção intensiva do Estado no que dizia respeito a propiciar condições favoráveis para tal desenvolvimento, condições essas que podem ser resumidas em financiamento por meio da concessão de créditos e incentivos de toda ordem.

Mas a questão dos trabalhadores urbanos não poderia ser deixada de lado, pois a classe, em vias de se organizar, significava, do ponto de vista da elite industrial, um perigo em potencial. Para isso, Getúlio Vargas criou, em 1 de maio de 1939, a Justiça do Trabalho. E, em 1940, estabeleceu o salário mínimo como parte de uma política salarial que, como vimos, era uma das reivindicações da ANL em 1935. Era a primeira vez na história do Brasil, desde o fim do trabalho escravo, que o Estado brasileiro tomava medidas protecionistas em favor dos trabalhadores. Até então, a grande massa de trabalhadores permanecia numa espécie de ostracismo jurídico e social. No mesmo ano foi criado o imposto sindical, que daria um grande fôlego aos sindi catos, que, capitalizados, desenvolveram enormemente suas atividades junto aos trabalhadores e ganharam impor tância. Em 1943, foi criada a Consolidação das Leis do Trabalho, a CLT. Todas essas medidas complementavam aquelas tomadas no início dos anos 1930 com a criação do Ministério do Trabalho, em que já haviam sido estabele cidas algumas regras, como as que regulamentavam as juntas conciliatórias para disputas trabalhistas, o horário de trabalho no comércio e na indústria, o trabalho da mulher e de menores, e a regulamentação dos sindicatos.

O objetivo era o de institucionalizar o máximo possível as relações entre a classe operária, a classe patronal e o Estado. Não havia altruísmo nenhum no esforço governamental. A questão era que, se mantidos no ostracismo ou marginalizados, esses trabalhadores poderiam ser cooptados por influência dos anarquistas ou dos comunistas. Tratava-se de uma estratégia do governo e das elites para anular completamente tal possibilidade que, no jogo da forças sociais, se arriscaria a se tornar nociva. Na prática, antes que grupos subversivos o fizessem, o Estado acabou por fazer a cooptação da classe operária por meio da sindicalização. Os sindicatos poderiam ser mais bem vigiados, apolíticos a princípio, deveriam estar voltados para reivindicações profissionais entre patrões e empregados. Getúlio desenvolveu, como ninguém, um tipo de política populista sui generis que consistia em uma forma simplória: ora bater, ora assoprar. Entre 1930 e 1945, a era Vargas se desenvolveria num misto de avanços e retro cessos, de vanguarda e conservadorismo.