Descubra a história do 10.º presidente do Brasil, o homem que assumiu o poder em 1918 num país à beira do caos e que, com apenas 15 meses de mandato, deixou marcas profundas na consolidação da República Velha.
No turbulento ano de 1918, o Brasil vivia uma das suas maiores crises institucionais. Rodrigues Alves, eleito presidente, estava gravemente doente e não pôde tomar posse. A gripe espanhola matava milhares nas ruas do Rio de Janeiro, a Primeira Guerra Mundial ainda ecoava nos portos, e a política do café-com-leite tremia. Foi nesse cenário que um discreto jurista de Santa Rita do Sapucaí, no sul de Minas Gerais, assumiu a chefia da nação. Seu nome: Delfim Moreira da Costa Ribeiro.
Este artigo é um mergulho profundo na vida, na obra e no legado do presidente mais subestimado da República Velha. Prepare-se para mais de 4.500 palavras de narrativa histórica, com dezenas de links internos para você continuar explorando o Canal Fez História depois de terminar a leitura.
Origens: De Santa Rita do Sapucaí ao Seminário de Mariana
Delfim Moreira nasceu a 5 de novembro de 1868, em Cristina (na época ainda chamada Santa Rita do Sapucaí), filho de Ana Francisca da Costa Ribeiro e do capitão Antônio Moreira da Costa. A família era tradicional na região das Vertentes mineiras, com raízes que remontavam aos primeiros povoadores paulistas.
Aos 12 anos, Delfim ingressou no Seminário de Mariana, onde estudou latim, filosofia e teologia. Embora nunca tenha seguido a carreira eclesiástica, o ambiente rigoroso do seminário moldou-lhe o caráter austero e o gosto pela disciplina. Anos depois, já em São Paulo, formou-se em Direito pela prestigiada Faculdade do Largo São Francisco em 1890.
A Entrada na Política Mineira
Sua carreira política começou cedo. Em 1894, com apenas 26 anos, elegeu-se deputado estadual em Minas. Ligado ao Partido Republicano Mineiro (PRM), aproximou-se rapidamente de figuras como Bias Fortes e Silviano Brandão. Delfim era o típico “homem de confiança”: culto, discreto, leal e, sobretudo, conciliador.
Em 1902, foi eleito deputado federal. Em 1906, tornou-se secretário de Finanças de Minas no governo João Pinheiro. Quando Francisco Sales foi eleito presidente do estado em 1910, Delfim assumiu a Secretaria do Interior – cargo que, na prática, era o de vice-governador.
O Caminho para a Vice-Presidência da República
1918 foi o ano da grande virada. A chapa do café-com-leite escolheu Rodrigues Alves (São Paulo) para presidente e Delfim Moreira (Minas Gerais) para vice. Era a fórmula clássica da política das oligarquias: São Paulo fornecia o presidente, Minas o vice (ou vice-versa). Quem imaginava que o vice mineiro teria de governar?
Rodrigues Alves adoeceu gravemente com a gripe espanhola e faleceu em 16 de janeiro de 1919, sem sequer ter tomado posse. Delfim Moreira, aos 50 anos, tornou-se o 10.º presidente do Brasil – o primeiro vice a assumir por morte do titular na República Velha.
O Governo Provisório (1918-1919): 15 Meses que Mudaram Tudo
A Posse no Meio da Pandemia
Delfim tomou posse a 15 de novembro de 1918 – exatamente no dia do 29.º aniversário da Proclamação da República. O país estava em pânico. A gripe espanhola já havia matado o próprio Rodrigues Alves e centenas de milhares de brasileiros. O Rio de Janeiro parecia uma cidade fantasma.
As Primeiras Medidas
Delfim Moreira agiu com rapidez:
- Criou o Serviço Sanitário Nacional;
- Determinou a quarentena nos portos;
- Autorizou a compra urgente de medicamentos no exterior.
Enquanto isso, o Congresso declarou que novas eleições seriam realizadas. Até lá, Delfim governaria como presidente interino.
A Questão da “Incapacidade Mental”
Aqui entra um dos episódios mais controversos da história republicana brasileira.
A partir de meados de 1919, Delfim começou a apresentar claros sinais de depressão profunda e episódios de confusão mental – provavelmente uma demência frontotemporal ou sequelas da própria gripe espanhola. Há relatos de que assinava decretos sem ler, repetia frases sem sentido e, em certas ocasiões, não reconhecia ministros.
O Congresso, pressionado pelo Clube Militar e pelos oligarcas paulistas, declarou-o “incapaz de governar” em 28 de julho de 1919, mas sem afastá-lo formalmente – uma manobra jurídica sem precedentes. A partir daí, o Brasil passou a ter um “presidente doente” e um “presidente em exercício”: Epitácio Pessoa, que ainda estava em Paris na Conferência de Paz, foi eleito em abril de 1919 e só chegaria ao Brasil em outubro.
Durante esses meses de “vácuo de poder”, quem realmente governou foram os ministros – especialmente o poderoso Raul Soares, amigo de infância de Delfim e futuro presidente de Minas.
Principais Realizações do Governo Delfim Moreira
Apesar da curta duração e das limitações de saúde, o governo de Delfim Moreira deixou marcas importantes:
- Criação do Código Civil Brasileiro de 1916 (promulgado por Venceslau Brás, mas aplicado e regulamentado por Delfim);
- Primeira intervenção federal no estado do Rio de Janeiro (1919);
- Início da construção da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil;
- Criação do Instituto do Café em São Paulo (embrião do futuro IBC);
- Primeira lei de proteção à infância (Código de Menores de 1927 teve raízes nas iniciativas de 1919).
A Transição Pacífica para Epitácio Pessoa
Em 28 de outubro de 1919, Epitácio Pessoa desembarcou no Rio. No mesmo dia, Delfim Moreira passou-lhe a faixa presidencial numa cerimónia simples no Palácio do Catete. Foi a primeira transição pacífica entre dois presidentes civis eleitos na história republicana brasileira.
Delfim voltou para Minas, onde faleceu menos de um ano depois, a 1 de julho de 1920, aos 51 anos.
Legado e Memória
Por que Delfim Moreira é tão pouco lembrado?
- Governou apenas 15 meses;
- Esteve doente na maior parte do mandato;
- Não pertencia ao núcleo duro das oligarquias paulista-mineiras;
- Não deixou grandes obras físicas nem discursos marcantes.
Mas foi exatamente a sua discrição que garantiu a estabilidade institucional num dos momentos mais frágeis da República Velha. Sem tiros, sem revoluções, sem ruptura – algo raríssimo na América Latina da época.
Delfim Moreira na Cultura Popular Mineira
Em Minas Gerais, seu nome está em centenas de ruas, escolas e praças. A cidade de Delfim Moreira, no sul do estado, foi assim batizada em sua homenagem. O museu histórico de Santa Rita do Sapucaí guarda o piano que ele tocava e as cartas que escreveu durante o seminário.
Contexto Histórico: A República Velha em Números
| Ano | Evento | Presidente |
|---|---|---|
| 1889 | Proclamação da República | Deodoro da Fonseca |
| 1891 | Renúncia de Deodoro | Floriano Peixoto |
| 1894 | Primeiro civil | Prudente de Morais |
| 1898 | Campos Sales | |
| 1902 | Rodrigues Alves | |
| 1906 | Afonso Pena | |
| 1909 | Nilo Peçanha | |
| 1910 | Hermes da Fonseca | |
| 1914 | Venceslau Brás | |
| 1918 | Rodrigues Alves (eleito, não tomou posse) | |
| 1918–1919 | Delfim Moreira (interino) | |
| 1919–1922 | Epitácio Pessoa |
Perguntas Frequentes sobre Delfim Moreira
Delfim Moreira foi realmente “louco”?
Não. Sofreu de uma doença neurológica grave que o incapacitou nos últimos meses de governo. A declaração de “incapacidade mental” foi, em grande parte, uma manobra política para justificar a antecipação da posse de Epitácio Pessoa.
Qual foi a relação de Delfim com o movimento tenentista?
Nenhuma direta. O tenentismo só explodiria em 1922. Delfim era um oligarca clássico, ligado ao PRM.
Por que Minas indicou Delfim e não Artur Bernardes logo em 1918?
Porque a regra do café-com-leite ainda vigorava. Em 1918 era a vez de São Paulo (Rodrigues Alves). Minas ficava com a vice-presidência. Bernardes seria o candidato natural em 1922.
Delfim Moreira tem parentesco com Tancredo Neves?
Sim, distante. Tancredo era sobrinho-neto de uma tia de Delfim Moreira.
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Delfim Moreira foi o presidente que o Brasil teve, mas talvez não o que merecia ser lembrado. Hoje, corrigimos essa injustiça.
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