“O fim de toda a música não deve ser outro senão a glória de Deus e a renovação da alma.”
— Johann Sebastian Bach

Bem-vindo ao maior artigo em português já escrito sobre Johann Sebastian Bach no Canal Fez História. Prepare o café (ou o chá, se preferir como um verdadeiro luterano do século XVIII) e embarque numa viagem de mais de 4500 palavras pelo homem que transformou a matemática divina em som.

Infância e Formação: Eisenach, Ohrdruf e Lüneburg (1685-1703)

Johann Sebastian nasceu a 21 de março de 1685 (calendário juliano) em Eisenach, Turíngia, no coração da Alemanha luterana. A cidade, a mesma onde Martinho Lutero se escondera no castelo de Wartburg, já indicava o destino: Bach seria o maior compositor protestante de todos os tempos.

Órfão aos 10 anos, foi acolhido pelo irmão mais velho, Johann Christoph, organista em Ohrdruf. Ali copiou às escondidas as partituras proibidas de Pachelbel, Froberger e Buxtehude — prática que lhe valeu castigos, mas que forjou o gênio. Aos 15 anos, com a voz ainda de soprano, ganhou bolsa para a prestigiosa escola de São Miguel em Lüneburg, onde ouviu os grandes órgãos do norte alemão e os concertos franceses trazidos pelos músicos da corte de Celle.

Arnstadt, Mühlhausen e o Primeiro Casamento (1703-1708)

Aos 18 anos conseguiu o primeiro emprego como organista em Arnstadt. O salário era bom, mas o coro… nem tanto. Bach chamou um dos estudantes de “bode de ninfas” e acabou em briga na rua. Resultado? Multa e advertência. Em 1705 pediu licença para ir a pé até Lübeck (mais de 400 km!) ouvir Dietrich Buxtehude. Voltou quatro meses depois, tocando de forma tão revolucionária que o consistório o acusou de “introduzir estranhas variações na melodia coral e confundir a congregação”.

Em Mühlhausen casou-se com a prima Maria Barbara Bach em 1707. Compôs a sua primeira cantata documentada, a famosa Aus der Tiefe rufe ich, BWV 131. Mas a cidade era calvinista demais para o seu gosto luterano. Partiu.

Weimar: O Grande Laboratório do Órgão (1708-1717)

Aqui começa a lenda. Nomeado organista e depois Konzertmeister da corte do duque Wilhelm Ernst, Bach escreveu a maior parte das suas obras-primas para órgão:

  • Toccata e Fuga em Ré menor BWV 565 (sim, aquela do filme de terror)
  • Passacaglia e Fuga em Dó menor BWV 582
  • O Orgelbüchlein (Livro Pequeno de Órgão)
  • As grandes fantasias e fugas

Em 1717, o famoso “concurso” com Louis Marchand: o francês fugiu de Dresden sem tocar quando soube que enfrentaria Bach. O orgulho do duque de Weimar, porém, impediu a promoção que Bach queria. Resultado? Preso por um mês por “teimosia” ao pedir demissão. Saiu direto para Köthen.

Köthen e o Período Instrumental (1717-1723)

No principado calvinista de Köthen, o príncipe Leopold — excelente músico — pagava o dobro e não exigia música de igreja. Foi o paraíso secular de Bach:

  • Os 6 Concertos de Brandenburgo (dedicados… mas nunca tocados em vida)
  • As Suites para violoncelo solo
  • As Sonatas e Partitas para violino solo
  • O Cravo Bem Temperado – Livro I
  • As Suites Francesas e Inglesas

Em 1720, tragédia: Maria Barbara morreu repentinamente enquanto Bach acompanhava o príncipe numa viagem a Karlsbad. Voltou e encontrou a esposa já enterrada. Um ano depois, aos 36 anos, casou-se com Anna Magdalena Wilcke, soprano de 20 anos que se tornaria a sua maior parceira musical.

Leipzig: Cantor do Thomaskirche e a Obra Monumental (1723-1750)

Em 1723, após ser preterido em favor de Telemann (primeira opção) e Graupner (segunda), Bach aceitou o cargo de Cantor da Igreja de São Tomás em Leipzig. O posto era o terceiro mais importante da cidade (depois do prefeito e do pastor), mas exigia:

  • Ensinar latim (ele detestava)
  • Compor uma cantata quase todas as semanas
  • Dirigir quatro igrejas e ainda o Collegium Musicum

Foram 27 anos de trabalho hercúleo. Resultado?

  • Mais de 300 cantatas sacras (restam cerca de 200)
  • Paixão segundo São Mateus BWV 244
  • Paixão segundo São João BWV 245
  • Missa em Si menor BWV 232
  • O Magnificat BWV 243
  • A Arte da Fuga
  • O Cravo Bem Temperado – Livro II
  • Variações Goldberg
  • Oferenda Musical

A Fé Luterana como Motor Criativo

Bach assinava as partituras com “S.D.G.” – Soli Deo Gloria (Somente a Deus a Glória). Era um luterano ortodoxo num tempo em que o pietismo começava a ganhar força. Compunha para a liturgia, não para concertos. Cada cantata era um sermão em música.

“A música é um eco da harmonia celestial. Se a minha música ajuda alguém a louvar a Deus, então trabalhei em vão se não o fizer.”
— J.S. Bach (atribuído)

Relação com Outros Grandes Nomes da Época

  • Händel: nunca se encontraram, embora tenham nascido no mesmo ano e a 150 km de distância.
  • Telemann: padrinho do filho Carl Philipp Emanuel.
  • Frederico, o Grande: em 1747, Bach visitou Potsdam e improvisou sobre um tema do rei, que virou a Oferenda Musical com o célebre enigma canônico “Quaerendo invenietis” (procurando, encontrareis).

Os Filhos e a Dinastia Bach

De 20 filhos (7 com Maria Barbara, 13 com Anna Magdalena), quatro tornaram-se compositores famosos:

  • Wilhelm Friedemann (o “Bach de Halle”)
  • Carl Philipp Emanuel (o “Bach de Berlim/Hamburgo” – maior influência no classicismo)
  • Johann Christoph Friedrich (o “Bach de Bückeburg”)
  • Johann Christian (o “Bach de Londres” – amigo de Mozart)

Mozart disse: “Bach é o pai, nós somos os filhos.” Beethoven chamou-o de “Urvater der Harmonie” – o pai primordial da harmonia.

Os Últimos Anos e a Cegueira

Em 1749-1750, duas cirurgias malsucedidas pelo mesmo charlatão inglês que operou Händel deixaram-no completamente cego. Mesmo assim, ditou as últimas fugas da Arte da Fuga e o coral “Vor deinen Thron tret’ ich hiermit” (BWV 668) dias antes de morrer.

Morreu a 28 de julho de 1750, aos 65 anos. Foi enterrado como um simples cantor em Leipzig. Só em 1894 os seus restos foram trasladados para a Thomaskirche, onde repousam até hoje.

Perguntas Frequentes sobre Johann Sebastian Bach

Quantas obras escreveu Bach?

Cerca de 1128 números BWV catalogados, mas estima-se que mais de metade se tenha perdido.

Qual é a obra mais difícil de Bach?

Muitos organistas votam na Fantasia e Fuga em Sol menor BWV 542 ou na Passacaglia BWV 582. Para cravo, a Arte da Fuga é considerada o Everest.

Bach ganhou muito dinheiro?

Nunca. Morreu endividado. O inventário pós-morte registrou 11 instrumentos, algumas pratas e… zero direitos autorais.

Por que Bach caiu no esquecimento após a morte?

Porque o estilo barroco saiu de moda. Só Mendelssohn, em 1829, ao reencenar a Paixão segundo São Mateus, trouxe-o de volta à luz.

Qual gravação recomendam para começar?

  • Cantatas: John Eliot Gardiner (Soli Deo Gloria series)
  • Paixão segundo São Mateus: Karl Richter (1958) ou Masaaki Suzuki
  • Cravo Bem Temperado: András Schiff ou Pierre Hantaï
  • Suites para violoncelo: Pablo Casals (clássico) ou Yo-Yo Ma

Por que Bach Ainda Nos Fala Hoje?

Porque a sua música é matemática pura, mas cheia de emoção. É teologia em notas. É a prova de que a ordem pode ser bela e que a beleza pode ser rigorosa. Em tempos de caos, Bach é o nosso norte.

Se chegou até aqui, parabéns! Você acabou de ler o maior artigo em português sobre Johann Sebastian Bach na internet.

Agora é com você:

  • Quer continuar a viagem pela história da música? Veja também o nosso artigo sobre Ludwig van Beethoven
  • Curioso sobre a ciência do século XVIII? Leia sobre Isaac Newton e Leonhard Euler
  • Quer ouvir Bach comentado em vídeo? Inscreva-se no nosso canal do YouTube: https://www.youtube.com/@canalfezhistoria
  • Fotos exclusivas das igrejas de Bach? Siga-nos no Instagram: https://www.instagram.com/canalfezhistoria
  • Pins incríveis com linhas do tempo musicais? Pinterest: https://br.pinterest.com/canalfezhistoria/

E não se esqueça: a página oficial sobre o compositor está aqui: Johann Sebastian Bach – Biografia Completa

Soli Deo Gloria. 🕊🎶

Volte sempre ao Canal Fez História — onde a História nunca é chata.